Você sabe o que é mecanotransdução?

A arquitetura e o metabolismo do tecido muscular esquelético humano são altamente sensíveis ao que a literatura atualmente convenciona denominar de ambientes mecânicos. As modificações na magnitude com que o volume e a intensidade do estresse mecânico são impostos ao músculo podem causar alterações nos padrões de expressão gênica e influenciar diretamente o processo de síntese proteica (4). 
Experimentos realizados com culturas de células musculares têm demonstrado que intervenções mecânicas induzem alterações nos mecanismos de síntese proteica que podem ocorrer independentemente da interação com outras células, ou de hormônios circulantes como a testosterona e os fatores de crescimento (1, 2, 4). Essas observações sugerem que o tecido muscular possui uma capacidade intrínseca de sensibilidade a essas informações, e que de alguma forma consegue convertê-las em eventos bioquímicos que regulam o processo de síntese proteica. Na literatura, esse processo de conversão desses sinais, ou dessa energia mecânica em eventos biológicos é denominado de mecanotransdução.
Para que a mecanotransdução ocorra, alguns mecanismos que recebem, acoplam e transmitem esses sinais mecânicos são ativados. Esse acoplamento é referido atualmente na literatura como mecanorecepção e é realizado pelos chamados mecanoreceptores (1, 2, 4). Diversos candidatos têm sido propostos como possíveis mecanoreceptores, sendo a maioria deles divididos em dois principais grupos: 

1) os lipídeos de membrana; 
2) as matrizes extracelulares integrinas do citoesqueleto (1, 2, 4).

A literatura também vem destacando que todo esse processo pode ocorrer devido ao fato da contração muscular per se incrementar dramaticamente a ativação da via Akt/mTOR (1). Todavia, diferentemente das sinalizações previamente estimuladas pelo IGF-1, a ativação da mTOR em resposta aos estímulos mecânicos pode ocorrer independentemente da Akt, através da produção de PA (ácido fosfatídico) via PLD (fosfolipase-D) (3). Na situação do repouso, a proteína afla-actinina, localizada na linha Z dos sarcômeros, se associa e inibe a PLD. O estímulo mecânico promoveria uma dissociação da PLD da afla-actinina, o que atenuaria a inibição da PLD, promovendo uma subsequentemente produção de PA, e levando a ativação da mTOR (3).
Em adição à sensibilidade aos estímulos mecânicos, parece que as células musculares também podem diferenciar entre os distintos tipos de forças mecânicas a que estão sendo submetidas. Como exemplo disso, podemos destacar o fenômeno observado quando alongamentos longitudinais são induzidos de forma crônica. Tal estímulo produz um aumento no número de sarcômeros em série, enquanto a imposição de cargas produz aumento da área em corte transverso, sem grandes alterações no comprimento do músculo (deposição de sarcômeros em paralelo). Entretanto, devido à complexidade do estímulo proporcionado ao tecido, esse conceito de que diferentes tipos de sinais mecânicos podem elucidar eventos moleculares únicos ainda permanece elusivo (1, 2, 4). 

Referências
1. Hornberger TA, Stuppard R, Conley KE, Fedele MJ, Fiorotto ML, Chin ER, and Esser KA. Mechanical stimuli regulate rapamycin-sensitive signalling by a phosphoinositide 3-kinase-, protein kinase B- and growth factor-independent mechanism. Biochem J 380: 795-804, 2004.
2. Hornberger TA, Sukhija KB, and Chien S. Regulation of mTOR by mechanically induced signaling events in skeletal muscle. Cell cycle (Georgetown, Tex 5: 1391-1396, 2006.
3. Hornberger TA, Sukhija KB, Wang XR, and Chien S. mTOR is the rapamycin-sensitive kinase that confers mechanically-induced phosphorylation of the hydrophobic motif site Thr(389) in p70(S6k). FEBS letters 581: 4562-4566, 2007.
4. Tidball JG. Mechanical signal transduction in skeletal muscle growth and adaptation. Journal of applied physiology 98: 1900-1908, 2005.

Autor : Bernardo Neme Ide, Ph.D.

- Doutor e Mestre em Biodinâmica do Movimento Humano, Unicamp - Pós-doc pela Unicamp e UFTM - Bacharel em Treinamento Esportivo, Unicamp