Um novo estudo recentemente aceito para publicação no International Journal of Strength and Conditioning, discute sobre o uso indevido de termos biomecânicos ao quantificar o desempenho dos atletas e as respostas psicobiológicas ao exercício. Dentre eles, os conceitos e definições de cargas externas e internas empregados na ciência do esporte. Veja abaixo os principais destaques do trabalho.
Carga Externa
Nas ciências do esporte, "carga externa" é um termo utilizado para descrever as medições objetivas do trabalho realizado pelos atletas, avaliada através de métodos como a produção de potência, velocidade, aceleração, e análise de tempo-movimento. No entanto, há uma inconsistência mecânica fundamental na definição. O conceito de "carga" em biomecânica, refere-se a uma força, e "trabalho" é realizado quando uma força move um objeto em um deslocamento na direção da força. A unidade SI de trabalho é o joule (J). Estudos que apresentam o trabalho físico dos atletas em unidades diferentes de joules, estão incorretos.
As Inconsistências resultam no uso incorreto e coloquial dos termos "trabalho" e "carga". Termos como produção de potência, velocidade, aceleração, métricas de GPS, e parâmetros derivados de acelerômetros, exceto a potência, não são considerados medidas de trabalho, e, portanto, o uso do termo "trabalho" nesse contexto pode levar à confusão.
A discussão ainda se estende ao uso adequado de termos durante os esportes em equipe, explicando como os sistemas globais de navegação por satélite (GNSS) e dispositivos acelerômetro/giroscópio podem fornecer medições de posição do jogador, incluindo deslocamento, velocidade e distância percorrida.
Carga Interna
Na ciência do esporte, a carga interna faz referência às respostas psicofisiológicas experimentadas por um atleta durante o exercício. Essas respostas podem ser quantificadas através de métricas como a taxa de percepção do esforço (RPE) e a métrica de impulso de treinamento (TRIMP), geralmente calculada com base na duração do treinamento e na frequência cardíaca média, com ajuste para a elevação exponencial do lactato no sangue.
No entanto, a literatura científica aponta inconsistências e confusões em torno do conceito de carga interna. Por exemplo, a carga interna é, por vezes, confundida com o estresse psicofisiológico, e os termos "carga" e "strain" têm sido usados de maneira inadequada e incoerente com a biomecânica.
Em biomecânica, as cargas internas são vistas como forças atuando dentro dos tecidos biológicos, induzindo tensão e deformação. Os músculos e sua estrutura são sensíveis a essas forças e tensões. A tensão é a intensidade de uma força interna em um ponto do corpo, que tende a alterar sua forma.
A métrica TRIMP, comumente utilizada, é criticada como mecanicamente inconsistente e inadequada, pois "impulso" em mecânica se refere à integração da força em relação ao tempo. Outras confusões mecânicas surgem do uso impróprio do termo "strain" em relação à carga de treinamento e monotonia, enquanto na biomecânica se refere à deformação de um corpo.
Em conclusão, embora os marcadores como RPE, HR e lactato no sangue possam representar respostas internas específicas ao exercício, eles não devem ser denominados como cargas internas.
Por fim, o estudo ainda propõe recomendações para a correta avaliação e quantificação do desempenho dos atletas tanto no treinamento de resistência quanto no de força:
**Treinamento de resistência:**
**Utilize métricas específicas**: concentre-se na velocidade relativa ou absoluta, potência, duração do exercício, distância percorrida e intervalos de descanso para a progressão do treinamento. Utilize as velocidades do limiar ventilatório (VT) e do limiar de compensação respiratória (RCT) para categorizar as zonas de intensidade.
**Treinamento de força:**
1. **Defina variáveis claramente**: considere variáveis como escolha do exercício (modo), carga, número de repetições por série, duração do período de descanso e ordem do exercício. Seja claro sobre a carga mecânica e a intensidade do treinamento.
2. **Quantificação do treinamento**: Use métricas como volume de carga (número de repetições × carga externa) para quantificar os programas. Considere tecnologias como captura de vídeo em alta velocidade ou transdutores lineares de posição/velocidade para avaliar os deslocamentos verticais do objeto, se necessário.
3. **Resolva as limitações**: reconheça as limitações do volume de carga, especialmente com exercícios de peso corporal, e adote abordagens convenientes para quantificar exercícios de força sem equipamento adicional.
4. **Evite termos ambíguos**: Evite termos como "deload" e, em vez disso, descreva um "período regenerativo" com manipulação deliberada das variáveis do treinamento de força.
Em considerações finais, é ressaltado que o termo "carga" na ciência do esporte é um termo genérico, qualificado frequentemente pelo termo "treinamento". No entanto, durante prescrições de treinamento específico, como o treinamento de força, "carga" refere-se à carga mecânica específica, vinculada à magnitude das forças e tensões que surgem durante as ações musculares. Isso destaca a importância da precisão na terminologia utilizada na ciência do esporte, para evitar possíveis confusões e inconsistências.
Essas recomendações visam aumentar a clareza na avaliação do desempenho e contribuir para os avanços tanto na pesquisa quanto na prática do treinamento de resistência e força. O uso correto da terminologia e a consideração de variáveis específicas de acordo com a natureza do treinamento garantem precisão e eficácia na avaliação e quantificação do desempenho dos atletas.
Link para o estudo:
https://journal.iusca.org/index.php/Journal/article/view/234